sexta-feira, 28 de agosto de 2015

COM ESSA GAROTA NUA ADORMECIDA EM MINHA CAMA ENQUANTO EU BEBO MEU WHISKY

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Na maior parte do tempo observo o quão deprimente as coisas corriqueiras podem ser. Os elogios sem motivo, as amenidades, o convívio com as outras pessoas. Vizinhos, colegas de trabalho, família e etc. É tudo um grande teatro mal ensaiado de péssimos atores e é só isso. Relações de uma fragilidade como ossos de galinha. Todos mantendo a pose da coxa de galinha assada até que se quebra e pronto. Viram inimigos. Esses são nossos relacionamentos mais comuns. Não quero que pensem que sou grande coisa porque não sou. Não sou, pois não consigo fingir. Não sei acordar de manhã comemorando mais um dia de vida medíocre, esperando que as coisas melhorem e desejando paz na Terra. Invejo essas pessoas, de verdade. Não acho isso uma coisa boa, de forma nenhuma, mas vamos combinar que a ignorância traz sim felicidade. Não tanto quanto o dinheiro, mas quem não tem cão caça com gato. Digo isso para deixar claro que não sou grande coisa. Não vou me fazer de vítima, porém sinto sinceramente que não passo de um amontoado de palavras que já foram boas e nada mais. Além, claro, de ser um beberrão convicto, que precisa de uma boa dose de algo alcoólico e forte para poder levantar da cama e enfrentar o dia. Um sedentário bosta que evita fazer qualquer coisa esperando que a inspiração venha no intuito de escrever qualquer bobagem que me faça sentir algum prazer por respirar.

Houve um tempo que eu fui a maior promessa da literatura de minha geração. Hoje não passo de um ex-futuro-escritor. Tento escrever qualquer coisa e não saio da primeira linha, e quando faço acho tudo uma porcaria. Talvez, de tanto escrever fracassos tornei-me minha musa. Dou voltas e não saio do lugar. Cinco anos escrevendo, até que fui longe. Mais longe que esperavam, já eu esperava mais. Sou um escritor de livro nenhum. Tenho um romance inacabado, outro que nem comecei a escrever e outro livro de contos que nunca concluo. Como tudo na vida não concluo porra nenhuma. Dou voltas no mesmo lugar como um peão de madeira de quando era criança. Um fracassado. Hoje não sou metade do filósofo que já fui e em minha melhor fase não fui um décimo do poeta que poderia ser. Talvez por preguiça, omissão, ou por perder tempo transando com todas as garotas que cruzaram meu caminho. Preciso comprar um carro, um computador novo, e uma televisão nova... E a maior emoção que tenho ultimamente é acordar de pau duro devido a bexiga pressionar a próstata.

Vejo as pessoas estudando cada dia mais e me pergunto; para quê? Não estou exigindo resposta, eu já as tenho. Cada dia mais e mais informação é despejada por todos os veículos de comunicação e hoje todos são comunicadores empenhados e continuo sem entender. Na prática, não se usa. Os jovens chegarão somente ao ápice de sua ignorância. Os velhos regridem para acompanhar os jovens na sua imbecilidade, pois é mais fácil render-se a ela que superá-la.

Então, estou finalmente de férias, e sendo assim, tenho por vinte dias a vida que gostaria de ter até o fim de meus dias. Não faltam cervejas e cigarros, todos devidamente organizados ao alcance das mãos e para que não falte numa madrugada qualquer. Gosto tanto de cervejas que poderia economizar um bom dinheiro vendendo as latas como os carroceiros fazem, mas sou orgulhoso demais para pensar nisso, e trabalho demais para ter de economizar com latinhas recicladas. Pensei nisso outro dia e por capricho comprei garrafas. Nesses dias mudei a marca da cerveja. Mudei, pois é bom mudar em alguns momentos. Há muita resistência na mudança em qualquer pessoa. Apesar de ouvirmos por aí que as pessoas odeiam rotina, toda mudança assusta como o uivo do vento na janela numa noite solitária.
Por falar em mudanças, passei meus 30 dias de carma anual sem maiores problemas. Terminei os últimos cinco numa viagem confortável e aconchegante. Estava a garota do Bourbon e eu num quarto antigo sem televisão, com moveis barulhentos e digo que poucas coisas são tão belas quanto ver uma garota de lingerie passeando pelo cômodo fazendo suas coisas de garotas. Sequer a imagem do mar em seu vai-e-vem de ondas e seu ronco contínuo é tão belo quanto ver uma garota em sua rotina diária de cremes e esmaltes e elásticos de cabelo e camiseta surrada passeando em frente aos meus olhos ajeitando a calcinha, penteando os cílios, e essas coisas de garotas. Eu poderia ter viajado, comprado minhas cervejas, fumado meus cigarros e sequer ter colocado meus pés na areia e sentido a brisa fria do mar e o sol escaldante queimando minha pele, pois poucas coisas são tão belas quanto acompanhar o vai-e-vem da garota do Bourbon só de lingerie, com suas dobras, suas curvas, indo para lá e para cá, dobrando coisas, arrumando outras coisas em seus lugares como quem rege uma orquestra, como dona do mundo e do tempo. Passaria horas bebendo e fumando e vendo o desfile desta garota fazendo exatamente nada, apenas exalando sua feminilidade e destilando seu perfume de cremes, desodorantes e perfumes e mais cremes e é tão delicioso que eu poderia comê-la, literalmente, comê-la. Mordê-la e mastiga-la e engoli-la. Fatia-la e engoli-la, tamanha delicadeza de seus passos, seus dedos ao tocar o chão gelado, quase como um gato, quase sem tocar o chão. A rotina de vê-la ali passando de lá pra cá sabe-se lá fazendo o que preenchendo o ambiente dela. Só dela. Todo o ambiente, todo o quarto, era só ela. Eu não passava de mais um móvel usado e barulhento. A diferença é que eu fumava, arrotava, peidava, bebia e às vezes transava. Digo às vezes, pois percebi que a idade chega pra todo mundo e ter de acompanhar a libido de uma garota de 21 anos não é tão mais fácil na minha idade, mas eu ainda não fico devendo muita coisa.

Contudo, eu pensava assim até brigarmos. Afinal, para me ver brigando com alguém basta deixar-me num quarto com qualquer ser humano durante uma semana e sim, eu, inevitavelmente acharei motivos para brigar com esta pessoa. Amigo ou inimigo. Não importa. Qualquer pessoa que fique tanto tempo próximo de mim me causará problema. Bem, briguei. Arrumei motivos para discutir e assim fiz. Caso contrário não seria eu. Depois que fiz passamos a noite sem nos falar e dormimos sem nos tocar. Até o dia seguinte, ela amolecer meu coração com o cheiro de café fresco, pois mesmo brava ainda assim levantou-se mais cedo para preparar o café preto, só pra mim, por saber que meu humor é muito pior sem o café preto de manhã. Uma santa esta garota. Pois bem. Mesmo um velho ranzinza como eu não poderia ficar imune a este carinho. Mesmo assim, me fiz de difícil na primeira hora após fumar o primeiro cigarro, após levantar-me, tomar meu banho matinal, e ainda assim mantinha-me de cara fechada, que era para ver que eu ainda estava bravo, só que não estava. Eu já tinha sido conquistado pelo café. Mas homem tem destas coisas. De marcar território, como cachorro de rua eu estava marcando o território. No sentido figurado eu erguia minha perna para mijar na dela. Como somos pobres de espírito, nós homens.

Preparávamos para irmos à praia quando ela consciente de suas ações ou não, já indecentemente penetrada naquele biquíni, pediu sabedora ou não, para que eu passasse protetor nas suas costas. A partir daí, velho, ranzinza, macho alfa, tornei-me escravo de minha libido e fizemos o melhor sexo de conciliação da história. Com tapas e unhadas a ponto de descontarmos toda a raiva adquirida na noite anterior. E digo; o melhor sexo de conciliação da história, de todos os tempos. Afinal, algumas coisas, feitas com raiva, nem sempre causam arrependimento.


Agora estou aqui. Escrevendo, nem tão fracassado assim. Com essa jovem garota nua adormecida em minha cama, enquanto eu bebo meu whisky, fumo meu cigarro e escrevo escondido no banheiro para não acorda-la.


Bento.

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

SOU O JESUS CRISTO DO RUM [A BARBA]

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Então eu estava muito nervoso. Era noite. Daqueles dias cansativos que você demora mais pra voltar pra casa que o período todo de trabalho. E o relógio te informa que em algumas horas você já precisará estar de pé e acordado novamente para ir trabalhar. Só que você não quer dormir. Você quer aproveitar a noite. Olha pela janela e vê a lua que te convida a beber e se divertir. Mas isso é só para quem tem direito. Nós trabalhadores não podemos. Nós, telefonistas, pedreiros, balconistas, eletricistas, encanadores, professores, vendedores, motoristas, lavadores de carros, limpadores de vidraças, atendentes, expositores, estoquistas, dentre todas as outras coisas, nós não temos este direito. Nós apenas dormimos e acordamos e trabalhamos, pois o mundo precisa de nós. O mercado e a economia precisam de nós. Inclusive aqueles que têm o direito de beber numa noite dessas, no meio da semana, eles também precisam de nós. E eu estava lá, em frente ao espelho, vendo meus olhos cansados de acordar quase sem dormir, querendo sair e me divertir sem poder. Mas confesso que antes de chegar em casa passei no boteco e pedi duas doses. Da forte. Por este motivo, talvez, eu quisesse trocar a janta pelo gargalo de uma boa cerveja gelada. Eu disse uma?

Um calor de sentir-se sujo. Duas doses no estômago depois de um dia cansativo e já me sinto poderoso. Quase como quando ouço The Doors no último volume. Olho no espelho e sou só sobrancelhas e bigode e barba. O cabelo já passa da hora de cortar e sinto calor. Lembro-me que escondido na cômoda, para as horas de emergência, tenho um meio litro de rum pela metade. Já ajuda em alguma coisa. Para fazer durar mais adiciono em cada dose dois dedos d'água. De meio faço quase um inteiro. É o milagre da multiplicação. "Sou o Jesus Cristo do rum", eu grito sem me importar com os vizinhos. Um pirata com a barba ruiva tomando rum como quem bebe água. Mais uma dose e agora fico nu para suportar o calor, mas ainda não é suficiente. Meu rosto não faz questão de esconder as marcas do tempo e dos incontáveis porres. Das noites sem dormir. Dos desamores. Há muito que contar em cada ruga, cada cravo, cada pelo de barba. E a barba? Enorme, com pelos eriçados, rebeldes, precisando aparar, mas que tempo tenho? Quando minhas horas de descanso reservam-se para dormir e beber e escrever. Algo me incomoda e a barba pode ser quem vai pagar o pato. Então entre o cigarro aceso e mais uma dose de rum eu acho a tesoura e começo a cortar a barba. A cada chumaço de barba largada no lavatório é um pouco de sofrimento que vai pelo ralo. Leva tempo para manter uma barba deste tamanho. Porém, não mais tempo que economizei quando optei por não perder tempo fazendo a barba.

A verdade é que de lua, como sou, por vezes preciso de uma grande mudança em minha rotina para sentir-me vivo. Vivo e ativo. Vivo e útil. E ainda tem a garota do Bourbon que permanece preenchendo meus finais de semana. Uma linda esta garota. De uma paciência ímpar. Também pudera, para me aturar, somente tendo uma paciência de monge tibetano, mas ao invés disso, ela é descendente de nordestinos mesmo, talvez seja isso. Além de paciente ela é quase tão preguiçosa quanto eu, logo, não se importa de ficar deitada tomando cerveja, falando sobre qualquer coisa e transando.

Não existe muito mais o que se possa querer numa garota quando esta não reclama de seus cigarros, sua vontade incontrolável de algo alcoólico e seu vício em sexo, dito isso, por vezes eu abro mão de meu casulo para levá-la em lugares que queira ir, afinal, quando se está com uma garota como ela é preciso abrir mão de algumas coisas para mantê-la por perto. É uma via de duas mãos. Não se pode viver sem abrir mão de coisas. Abri-se mão da cerveja importada de trigo para poder investir em quantidade de cervejas nacionais e assim poder comprar garrafas que vão te deixar suficientemente bêbado. Abre-se mão, por vezes, da garrafa de Bourbon importado para poder tomar um bom café da manhã a cada três dias de ressacas consecutivas. Abre-se mão de comer em restaurantes boca-de-porco, que servem comida como quem serve para um batalhão, com quase um porco inteiro frito em seu prato clamando para ser saboreado com as mãos para poder impressionar uma garota num restaurante que serve comida como se fosse alpiste, com pratos decorados como aquela tia perua. Vivemos abrindo mão de coisas esperando conseguir outras, porque ainda somos daqueles que têm que escolher entre dormir ou aceitar o convite da lua que nos chama para beber e ficar bêbado e vomitar metade do que bebemos para poder beber mais e não lembrar do que fizemos na noite passada. Nós ainda somos os telefonistas, pedreiros, balconistas, eletricistas, encanadores, professores, vendedores, motoristas, lavadores de carros, limpadores de vidraças, atendentes, expositores, estoquistas, faxineiros, porteiros, zeladores, carteiros, ajudantes, auxiliares... E continuaremos até que a morte nos convide para dançar.



Bento.

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